quinta-feira, fevereiro 17, 2011
MARILIA LOPES
A ARTE POÉTICA DE MARILIA MIRANDA LOPES
LIAME
As minhas poesias são
Horas de esquecimento…
Lugares
sagrados,
Templos.
São viagens pelo Universo
à volta do que eu penso em verso, ciúmes
de não poder viajar realmente
através dele…
Se alguém perguntar por que me fascino
com tantos mistérios d’astros e de cometas,
com tantas constelações e planetas,
repara apenas
através dos meus sentidos
como se eu não tivesse a mínima importância.
A minha ânsia
é desaparecer como meteoro fugaz
por entre as nebulosas de gás
e procurar outro Sol, nova distância
que me separe,
encontre e ame…
longe…livre…
Em liame!
SOLIDÃO
Enquanto passava a solidão
Voltei à impressão do que seria essa figura:
Enorme, cinzenta, escura, de grande porte
Por não ter tido ainda a sorte
De se encontrar a si mesma
E deixar de ser solidão…
Solidão-dó, solidão-dá
Solidão não dá a ninguém!
Nas cavernas dos escritórios há grandes dormitórios
De gente impressão
Que se cumprimenta afável, politicamente correcta
A navegar horas a fio na linha magnética
Em nau cercada de informação…
E a senhora dó, dó do seu coração
Passa opulenta e esmaga o passo:
Diz que é obra do progresso
Do cansaço e do sucesso
Da ansiedade, da depressão
Dos pensamentos escusados,
Inúteis aos esfomeados
Do continente africano…
A senhora dá, dá do seu coração
Ondulante e sensual
No vazio que se consome
Repete, circinada, a condição:
Quando entra, não bate. Deixa uma ruína incolor
Ergue-se, invisível
Estende o braço formatado, estivador
E diz…”Vem!”
LEMBRANÇA SINE DIE
A quantos watts te pressenti daqui não sei
chegando vertigem vértice vento, logo
medievo cavaleiro ansiando dama em altiva
varanda de castelo iluminado, fogo
multo piano azulando a tempestade em silêncio…
Repousaste na calma suprema do monte
entre o nardo de sândalos e de cedros
luzes vãs de pirilampos, uivos de seres em extinção…
Toda a tua presença serenou, curiosidade ateou indignação…
Leva-me contigo, então, já que me procuras…é só uma
a terra onde não te vem à memória nenhuma
lei universal!
Sem dia, sem vez afloras, pois me cultivas, te curas
Prometes mais dádivas de um amor intemporal
Natureza convulsiva de espasmos violentos e capaz
de criaturas tão belas!
Na noite me recolhes, mãos de rara orquídea orgulhosa
Nesse destino de te enviares como amante e amor
Amor no qual o real só cabe segmentado…
Lembra-te, lembramo-nos até à falta, até à sobra
Vidas exaustas de investidas audazes…
Fomos nós!
ALVÃO
Neste Alvão onde a saudade germinou
A textura mais anil é a que te cobre o pensamento
Fico a ver-te onde a magenta se ausentou
No banco a preto e branco cuja sombra
É dádiva de uma árvore gigantesca estonteante
A contorcer-se no chão onde se atropelam
Raízes torneadas rompendo a terra
Tão simples e felizes
Os insectos que sobem o tronco vigoroso
Tão leves e verdes
Os pensamentos que a árvore te transmite
Levantas-te bruscamente sempre que isto acontece
E procuras conduzir-te enquanto é tempo
Para o espaço que mais fendas minimize
E curas a enfermidade para que a verdura te indemnize
O prazer e o receio de escutar
QUERO FICAR
Quero ficar entre os teus braços
E perceber que um dia é um diamante
Dinamite ou apenas nuvem doce
A enrolar-se nas semanas
De horrores e dramas
Entre os teus braços a criança que sou acorda
E sente que nem sempre se fica imune
A todo o impulso que as coisas têm
Catapulta que segue cega
Em direcção a parte incerta
Numa roda gigante e circular
E é então que adoece a criança que se aborrece
Através da paisagem da janela e dos montes da sua terra
Timbre do seu corpo vacilante
Entre os resguardos da ponte arterial
E quando amadurece por instantes
Vê que tudo o que acontece não é senão uma hélice
Sob o cicio de um trevo raro a lembrar
O que era antes
O TEU OLHAR
O teu olhar é o mais
escala absoluta
Fechas as pálpebras
estranha ausência
ou saudades, esse vislumbre, esse
Atravessado três vezes por um denso
o teu olhar é o mais
brilhante
giratória grandeza abrupta
Perto ou longe já se incendeiam
partituras sós, o concerto exige
ao receber-te sempre, ó
Preparo
É hoje o teu regresso
noite urdida na radiante
Atravessando o céu
devolvendo a minha chuva
TUDO EM TI
Tudo em ti é sumo, não há linhas a mais
No quadro repleto pendurado no tecto a chuva abranda
Sabes quando a escuridão reflecte cor e as palavras são prata
Na esquadria dos limites
Se vires tudo outra vez a rua expende-se e é tua
Nos fins dos becos sem saída subtrais a plataforma
Raiz no alto da colina que se transforma
em mil colcheias semi-contentes
Antes o calor do corpo vivo sangue emancipado
durante a vida batida ferozmente
Um túnel
Céus rasgados nos verdes alcatifa dos montes
no si bemol de um gesto de ternura por tudo isto com importância tanta
Sempre caindo levemente como a neve radiografada na doçura do horizonte
Diante de ti circulam
réplicas de um sismo
outrora abismo
vapor
Sossegam as personagens nos camarins grinaldas de palmas
Inefável expressão nos traços das epidermes
Fusão desses aplausos faustos risos
Senhoras e senhores, acabou a encenação das almas
Deixem-nas no paraíso
Estão enfermas
AINDA
Ainda me desnudas no vento
sintagma das coisas
Ainda me constróis
Ainda me dizes mistério
Ainda me suplicas
Caminho
Ainda me susténs no árido
Non sense dos dias
Ainda me levas
pela láctea
Via do teu corpo
romeiro
NO REBENTAMENTO
No rebentamento o poema
um voo no vácuo
em suspenso
como se lançasse no traçado da asa
um fluido cristalino
Sob
a ferida
pássaro branco tingido
perturbado
o rugir
DEITO O RIO
Deito rio
Este território é um violento
e há um rouco
Tomei a liberdade
de não responder
Importava destapar
onde lavamos com sabão
a cidade
As silhuetas ainda ouvem
às vezes são pólvora
Urge
não ter território
É um nada todo o verso
MARILIA LOPES – A poeta portuguesa Marília Miranda Lopes formou-se em Línguas e Literaturas Modernas (variante de Estudos Portugueses) pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Atualmente é professora de Língua Portuguesa do Ensino Secundário e formadora pelo Conselho Científico -Pedagógico de Formação Contínua nas áreas e domínios de Língua Portuguesa; Didácticas Específicas e Oficinas de Escrita – Poesia e Teatro. Ela foi bolseira dos Serviços de Belas Artes da Fundação Calouste Gulbenkian, ao abrigo do programa “Dramaturgia Portuguesa”. Integrou a representação do Norte de Portugal no Congresso Luso-Galaico “O Livro e a Leitura”, realizado em Santiago de Compostela, juntamente com António Cabral, A.M. Pires Cabral, António Mota, Anabela Mimoso, Luísa Dacosta, João Pedro Vaz, Manuela Bacelar, Arsénio Mota, Manuel António Pina, entre outros escritores. É autora de canções para a infância que integram vários projectos de animação do livro e da leitura. Escreveu Poesis em Oásis (poesia, 1994), Framboesas (Teatro, 1996), Geometria (poesia, 1998), O Escudo Invisível (Conto) Templo (poesia, colecção Tellus, nº10, 2003) e Duendouro – Era uma vez um rio… (Teatro, 2004) - Edições Afrontamento. Como cantautora tem feito canções em português para a banda “Croquis”, na qual é vocalista/guitarrista, juntamente com Trindas (baixista/compositor), Paulo Pelotas (baterista/percussionista) e Luís Novo (guitarrista). Tem participado ativamente em vários eventos culturais como “Portuguesia (Famalicão), 1º Festival de Literatura do Algarve e em filo-cafés promovidos pela Incomunidade e pela Associação Extrapolar. Aqui estão reunidas as poesias dos seus vários livros, confirmando o seu talento e sua verve poética. Daqui do Brasil, meus aplausos de pé para Marilia Lopes. Veja mais dela blog Douroscripto, no MySpace e no Gremio Literario Vila-Realense..
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