sábado, novembro 01, 2008
POETAS DO RIO GRANDE DO SUL
THOMAZ GUILHERME ALBORNOZ NEVES
EXÍLIO
O instante ao sol
Abole a existência da noite
Mas o infinito na tarde
Esbarra igual no limite do olhar
Além do que posso ver
O universo
É a falta de alcance da minha visão
Some na areia o sol da poça
E no ar a minha ausência
Dragado pelo que respiro
Não sei quem sente o que vivo
A paisagem em torno
É a própria face para o cego
Escrevendo, à beira-mar
No tom que me forjou
Um dia
Ondas ecoam dunas
Me desconheço em ninguém
E o que no silencio escuto
Responde ao que não pergunto
Escrevi para saber o que escreveria
Se escrevesse
Mas o que digo
Repele meu entendimento
Penso como quem esquece
Como quem cai subitamente no esquecimento
E me expresso
O que escrevo é alteado pela linguagem
Antes mesmo de haver sido escrito
Quando a expressão toma de assalto o pensamento
Eu estou entre o estado não verbal e este
Alheio a ambos
Aqui tudo é artifício
Diante do poder vazio do não dito
Quem escreve é um estranho para mim
E me torna um estranho ao fazê-lo
O dono do céu
Repete
O arco da duna
Onde sou a agulha
Vista
Da vigia do farol
Escrevo contra a escritura
E o que escrevo
É o que resta da realidade
A descoberta de poetas no sótão
Um baú deles
É certo que tenha aberto a minha vida
E talvez por folheá-los juntos
Sem associar nenhum aos poemas
Em cada um eu sinta muitos
Jamais vira o mundo antes
Com olhos
De quem escreve
Desperto agora outro
Embora eu mesmo ainda
E cada coisa serve ao poema
O momento da escritura
É represado pela ausência do sentido perseguido
É disso que se trata:
Palavras que faltam
Para dar ritmo a um estado ainda sem linguagem
Todo impulso sem realidade
Por momentos
O universo
É só o que parece
Seu próprio encantamento
A solidão
De cada um
É a de cada coisa
Em torno
O mundo ocorre
Em si mesmo
THOMAZ GUILHERME ALBORNOZ NEVES – o poeta e advogado gaucho, Thomaz Albornoz Neves é mestre em Literatura Brasileira e realizou, entre outros, o curta metragem O braço, em 1991. É autor dos livros Renée (1987), Poemas (1990), Sol sem imagem (1996) Exílio (2008), este último que reúne os poemas selecionados neste espaço.
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