sexta-feira, junho 12, 2009

O TRÂMITE DA SOLIDÃO



Imagem: Estudo para o telão de cena do balé "Tristão e Isolda", de Salvador Dali (1944)

ADEUS, ISOLDA

Luiz Alberto Machado

Desde sempre a minha vida por um fio, fuga no frio das trempes e desvalida, já me dado como morto nas terras perdidas das trevas e ruínas, devorado por tudo ao meu redor. Sempre foi. E eu só Tristão, jogado órfão na vida, expatriado, navegante incauto à deriva, cavaleiro errante em carne viva pronto para ser arremessado para os confrontos entre gregos e troianos, contra os irlandeses e romanos, judeus e germanos, lusos e americanos, contra tudo e sicranos determinado pela busca do Santo Graal. Morto e ressuscitado tantas vezes Ícaro, muitas vezes Sísifo, quantas vezes nada deplorado, jogado pros infernos até pela boca amada.

Desde sempre. E eis que ela surgiu no mês de maio do nada do meu inopinado, me fez lacaio, eu, pobre coitado, sem ter onde cair morto e arrebentado. Tristão mais que dilacerado, entregue às baratas, derreado. Ela animou-me a vida, recolheu-me da barbárie, deu-me a pós-modernidade e força para enfrentar guerras, máfias, deuses, ogros, traições, sogros e rebeliões, motins, exclamações, tocaias, terrores, ciladas, horrores. E sem elmo nem escudo, enfrentei tudo e fui vencedor com os tons intensos do drama de Wagner e ferido com a espada envenenada que me dilacerou a alma, definhou-me a vida e submergi ao subterrâneo mundo dos mortos.

Se havia a glória, jamais havia sabido. E ressuscitei pela primeira vez. Fui embalado pelo prelúdio do amor, tratado pelo encanto que sarou minhas feridas, dissipou todas as mágoas, dores, traumas e infortúnios. Fui tratado com todos os antídotos e fui curado de todos os venenos para me libertar de mim e das ilusões. E fui levado aos aposentos paradisíacos, iniciado na alcova dela onde o éden é o mar sereno de um dia radiante de felicidade.

Reencarnei então na carne dela onde me redimi de todas as derrotas e cavilações, me glorifiquei com seus beijos que eram a panacéia que me dava ânimo para todas as lutas e façanhas. E nossos encontros ao meio dia me revigoravam para superar todas as mazelas e fatalidades. E a nossa entrega por toda tarde era o refúgio do guerreiro para se reabastecer de luz e determinação. E toda nossa escalada noite adentro era a revelação de todos os segredos inauditos e irreveláveis. E nos amamos e fizemos o mundo. E sucumbi mil vezes para que seus lábios apascentassem minhas feras loucas e vorazes. E me enterrei mais de mil vezes para que seus seios apaziguassem a minha insônia e me dignassem o valor da queda para erguer o troféu da vitória. E me aninhei milhões de vezes para que seus braços alentassem a minha loucura de vencer o mundo mesmo que não me restasse mais nada. E me agarrei todas as vezes às suas coxas para que ela me levassem aos tesouros da maior riqueza dos céus até ter-me embrenhado no seu ventre para que eu possa sempre sorver do néctar da vida.

Reabilitado e pronto, dependente da sorte caminhei com seus pés nas águas siderais do infinito. E o seu corpo me curou tantas vezes quanto quando fui mais de uma vez atraiçoado pela espada do desamor. E amparou quando a febre ardia alucinada e me guardou da tempestade e da insolação. E me sarou todos os cortes, feridas e maleitas. E me arrastou pros abrigos, me esquentou com o seu calor e ministrou ungüentos e meizinhas quando eu estava entre a vida e a morte. E me fez dormir o sonho dos apaziguados. E me deu conforto e me salvou da morte de ontem. E me remediava brindando de beijos muitos e além de nossos desejos mais reverberado.

Hoje encaro a morte de Tristão. Depois de rompermos galáxias com nossas entregas e nos tornamos um só na imensidão cosmogonia. E nessa ubiqüidade nos perdemos. Tudo se esvaindo pelas correntezas do rio porque já não somos nós nem mais nada, apenas o nosso escândalo por não me entender o gesto nem a minha língua. Por renegar meus sentimentos e ignorar meu coração, mouca no nosso escândalo patético sem nem me ouvir gemer o prazer de roubá-la para fugir comigo e implorar todas as horas que fosse minha para sempre e que tudo seria diferente assim. De mim, apenas a gratidão porque nunca fui tão feliz, porque nunca mereci ter sido tão inteiro e vivo. A minha gratidão porque nunca lhe dei nada que pudesse ver de meu doado para a sua doação. Nunca presenteei nada nem lhe fiz buquê de rainha nem princesa. A gratidão do ingrato só na dor da separação da nossa tragédia além da morte. Assim é o amor.

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