quarta-feira, janeiro 07, 2009

POETAS DE PERNAMBUCO



VIRGÍNIA LEAL CRISÓSTOMO

DESEJOS DE MULHER

O que a mulher deseja?
Driblar o tempo
e sua alma nua
brincar com a lua
Cabelo ao vento,
Nos pés o mar,
lagartear.
O que dá prazer à mulher?
Chegando em casa
O sutiã tirar
Sapatos ao ar
Liquidação todo dia
O prato preferido
Chocolate escondido.
Amigos, muita conversa
Cerveja gelada à beça
Sorrir muito, gargalhar.
O que faz a mulher feliz?
De quando em vez
Minuto de fama
Com café na cama
Ter alguns instantes
De apalpes frenéticos
Promessas picantes
A ternura, o alento
De ver o pequeno
Sereno a dormir.
O sonho de toda mulher?
Camisola, pijama
Na cozinha o aroma
De cuscuz no fogão.
Entrelaçar as pernas
Sob lençol macio
Uma preguiça eterna
Do que a mulher precisa?
Explicação não dar
Do humor a oscilar
Momento de solidão.
Milagre se faça
Enfim ter a graça
De ser entendida.

SALGUEIRO

No recomeço de tudo
o sopro da vida pulsa
no escuro útero

É a regressão do ser
a vestir-se de grão

O broto em mutação
cava a passagem de ida
ao desconhecido instante
de orvalho e de sol
de vento e de lua

Fiel ao fio que o ancora
oferta à generosa chã
altaneira fronde
de flores e frutos

À tormenta e sua ceifa
inclina-se em reverência
e doa-lhe imoladas folhas
adubo de gérmen latente

Cada nó, cada gume
urde a preciosa trama
que forma a antiga morada
de todas as eras

O sopro da vida pulsa
e tudo é recomeço
neste jeito humano de ser

SER

No singular é pujança
que vaza e bebe e mergulha
para em seguida emergir
e se deixar derramar

Na alteridade oscila
o pendular desejo
a insinuar sem dizer
no seu falar de viés
de sinuosas vias

Na plenitude é presença
de grota a colher vida
contraste de sombra e de luz
a permear lacunas
freqüência de onda lunar

É singular e plural
o sensual divino
do feminino ser
Feito cordas que vibram
antigas canções de ninar

PAR A PAR

O equilíbrio entre dois
na gangorra
é não ficar do mesmo lado

Não haveria diversão
não fosse o impulso sincronizado
às vezes desajeitado
a mover a gangorra

Sem a alternância
um estaria isolado no topo
e o outro preso no chão

E não desfrutariam do prazer
de estarem para a par na gangorra
a eixo de cada oscilação

MANTO AZUL

O sol adormece sobre o cansaço do dia.
Na penumbra das horas a vida repousa
enquanto as trevas cumprem seu destino.

No encontro da noite com o dia,
a lua recolhe os miasmas sinistros
que o sol em breve irá cremar.

As últimas lágrimas de orvalho
diluem-se sobre as folhas,
umedecem a terra,
acordam a semente.

E a brisa da aurora dispersa as nuvens
para dar passagem à manhã
a envolver de esperanças
com seu manto azul, o novo dia.

1
Dança a brisa sob as copas,
que sonham ser asas,
no luar que reverbera.

2
A noite caminha
pelos olhos da coruja,
no transe da chama.

3
Pêndulo que vai,
curva a haste e não quebra,
pêndulo, amém.

BUMERANGUE
Ao amigo e poeta Lúcio Ferreira

Quando prendo, perco
Ao perder, procuro
E, buscando, encontro
No encontro, solto
E, soltando, volta
No retorno, vejo
O que vejo, escapa
Observo e integro
O que integro, amo
E o amor liberta

VIRGÍNIA BARBOSA LEAL CRISÓSTOMO – a poeta, escritora e advogada pernambucana, Virginia Leal Crisóstomo, é integrante do Grupo Literário Celina de Holanda e da União Brasileira de Escritores - UBE. Seu percurso poético teve inicio em 2003, quando publicou o livro “O Caleidoscópio da Vida”. Em 2005 editou “Para quem não tem colírio – Desnudando o comportamento compulsivo”, e “Fênix”. Participou de algumas antologias, entre elas “Pimenta Rosa” e “O Fim da Velhice – A superação bem humorada de um conceito”, “Pimenta Rosa”, “Antologia das Águas” e “Vozes – A Crônica Feminina Contemporânea em Pernambuco.É editora do blog VCrisostomo reunindo seus poemas, contos e crônicas.

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