quarta-feira, novembro 14, 2007

OLGA SAVARY



A poeta, escritora, jornalista, contista, romancista, crítica, tradutora e ensaísta paraense, Olga Savary, hoje radicada no Rio de Janeiro, já foi agraciada com vários dos principais prêmios nacionais de literatura, entre eles o Prêmio Jabuti de Autor Revelação, pelo livro Espelho Provisório, concedido pela Câmara Brasileira do Livro (1971), o Prêmio de Poesia, pelo livro Sumidouro, concedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte (1977), e o Prêmio Artur de Sales de Poesia, concedido pela Academia de Letras da Bahia pelo livro Berço Esplêndido (1987).Traduziu mais de 40 obras de mestres hispano-americanos e os mestres japoneses do hai-kai. Foi ela a primeira mulher a lançar um livro inteiro de poesias eróticas. É autora, dentre outros livros, Espelho Provisório (poemas) 1970, Sumidouro (poemas) – 1977, Altaonda (poemas) 1979, Magma (poemas)1982, Natureza Viva (poemas) 1982, Hai-ais (poemas) 1986, Linha d'água (poemas) 1987, Berço Esplendido (poemas) – 1987, Retratos (poemas) 1989, Rudá (poemas) 1994, Éden Hades (poemas) 1994, Morte de poema (poemas) -1996, Anima Animalis (poemas) – 1996, O Olhar Dourado do Abismo contos) 1997, e Repertório Selvagem (poesia reunida) 1998.
Em 1999 recebo a singela correspondência escaneada acima onde ela fala do seu Repertório Selvagem – Obra Poética Reunida: 12 livros de Poesia, enviando os poemas abaixo.

LIMITE

Ausente e lassa, queria
Estar pisando
A areia fina de Arraial do Cabo
A areia grossa de Amaralina
Em Goiás Velho urdir a tarde
Com Bernardo Élis e Cora Coralinda,
Fareja
Cheiro de candeia por toda Ouro Preto...
Mas estou presa às molduras
De todos os meus retratos.


RESUMO

Palavras, antes esquecê-las,
Lambendo todo o sal do mar
Numa única pedra.


UM DIA, OSSOS

A manhã trouxe surpresa de ossos
Guardados em gavetas
Ou organizados atrás de opalescentes,
Dourados vidros,
No corredor propício ao mistério.
Então é o susto nos olhos
E o medo nas mãos inábeis
Tocando toda essa precária matéria
Antiga e clara
E tirando no toque o som de uma música
Escondida
Nessa antiquíssima,
Milenar memória.


HORA DO RECREIO

Comer, quero comer
O bicho de tres patas:
Roê-lo até o osso.


CANTIGA DE RODA PARA ADULTOS

Anel de fogo para teu dedo sou.
Adinhem que anel
E qual o dedo.


DESCOBERTA

Digamos que só
Heráldica é o mar.
Vassalagem o resto.


PÁSSARO

A noite nãoé tua
Mas nos dias
- curtos demais para o vôo –
amadureces como um fruto.
Tuas asas seguem as estações.
É tua a curvatura da terra.




Do seu livro Hai Kais, reunindo os 36 anos (1950-1986) de poesia, onde ela introduziu uma inovação: acrescentou um verso a mais, feito uma coda, um arremate, ou como ela mesma diz na introdução do livro: “(...) por assim dizer, como se faz em música”. Dela diz Gerardo de Mello Mourão: “(...) os hai-kais dessa amirável poeta que é Olga Savary. Ela gaurda, com mestria maior, aquilo que os haikaistas definem como a virtualidade poética típica do hai-kai: - o conhecimento lírico que nos situa como ´num fio de navalha, entre o diáfano e o espesso`. (...) o contraponto do hai-kai brasileiro de Olga Savary, que guarda a inuberância – para usar uma palavra rilkeana – do cânon milenar de dezessete pés métricos. Cada um caindo sobre nós, lapidado como um cristal, mas também vivo como uma gota de orvalho, na brevidade de sua expressão. Como uma gota de poesia”. Deste livro, destaco:

NUA E CRUA

Não tendo pra onde voltar é que me largo pra rua,
Eu que seria leito de rio, leito de mar, maré,
Sem porto ou barco, peixe fora d´água, pássaro no vôo
Mas quede a asa?


NOME

Eu disse o nome do amor muito sem cuidado.
Disse o nome do amor quase por acaso.
Disse o nome do amor como por engano. Ainda assim
Meu corpo ficou cheio como umrio, da terra o coração habitando.


GEMINIANA

Esta quase sempre correu, fugiu da armadilha,
De ser prendida descobre o encanto. Amor
Que faz desta que sendo caça é caçador
E ama de maneira clara porque pertence aos ares.


AMURUPÉ

Ao mar, ao mar – diz o velame à nave que o conduz
E à confundida cabeça geminiana: eu não te amo
Amo só o prazer que tu me dás.


NOME

E este amor doido,
Amor de fera ferida,
É esse amor, meu amor,
O proprio nome da vida


PÁSSARO

A noite não é tua mas nos dias – curtos demais para o vôo –
Amadureces como um fruto. Tuas asas seguem as estações.
É tua a curvatura da terra.


CERNE

Nada a ver com fonte mas com a sede
Nada a ver com repasto mas com a fome
Nada a ver com plantio mas com a semente.


O DESEJO ABSOLUTO

Criar o amado
Sem a injustiça da forma
Sem o egoísmo do nome.


ENQUANTO

Sou inconstante como o vento
Sou inconstante como a vaga
Porisso fica enquanto estou desvelada
Enquanto eu não for vento ou vaga.


SAVARY, Olga. Hai Kais. São Paulo: Roswitha Kempf, 1986.

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