quinta-feira, maio 15, 2008

POETAS DO RIO DE JANEIRO



Foto: Janet Gomes.

MÁRCIO CATUNDA

A LIVRARIA

Adentro os umbrais do Edifício Marquês do Herval, o rito de passagem conduz às dimensões lúdicas.
Desço a espiral de um subterrâneo de luzes, giram, percepções de cristal:
O olhar desvenda iluminuras, códices de preciosa industria.
Anticaverna do tempo, flui o rio da memória, núcleo de reverencia do mundo.
Nem toda livraria é um pórtico da galáxia, insígnia da vida. Mas se o Leonardo é o patrono, um gênio conversa com o espírito dos livros e o acervo suscita viagens insólitas.
Nem toda livraria exalta inexorável fortuna.
Mas se a vitrine é aquarela mística, ignição do estro, motor geracional da história, saio pela galeria conduzindo um artefato de plástico, repleto da prosódia universal.
Se o patrono é Leonardo, a livraria é ponto cardeal de insônia e êxtase.
Arcádia! Ágora! Acrópole! No frontispício está escrito:
“Livraria Leonardo Da Vinci”.

INSTANTE DA URCA

Minha solidão, os barcos, a inquietude do mar e o tempo nebuloso....
O frio insólito de setembro, essa angustia de carros na rua estreita....
Mas, ao menos, a perspectiva é de alumbramento e, em mim, a visão dos prédios é um arco-iris, com a esperança de um tempo que se reconstitui.
Que esse desejo de sol me aqueça o gelo interior e derrame azul na moldura do relevo.
(A cidade se descontina em sinuosas simetrias).
Aves do céu, trazei os fulgores do dia!

MAR DE COPACABANA

Maroto mar, ó mar que se estronda e estruge,
atro mar, matreira onda,
lava os farrapos dos indigentess,
lava o pensamento dos dementes.
Mar romântico do meu Brasil,
Lava o velo cu do mulheril.
Mar azul de Copacabana,
Mar de Deus, grandeza soberana,
Mais do espírito que da matéria,
Flutua sobre a humana miséria,
Lúbrico arcanjo fenomenal.
Tu fecundaste o mundo ancestral,
Rei da vida terrena e aérea,
Porteiro do poder colossal.

CLARIVIDÊNCIAS DO ARPOADOR

Recanto onde a vida repousa na pele das águas.
Varanda de onde a fruição anímica qual talismã de ágata, reverbera matizas.
Tórrida delicadeza flui.
Espadas se espraiam nas linhas fúlgidas, viajam procelosos torvelinhos.
O clarão acende fagulhas em toda vaga, na espuma o arco-iris se prenuncia.
Florilégios no céu, caminhos imantados de milênios e o espírito habitante das grotas, tudo converge no alumbramento, miragem, chuva de luz, visão astral.
As entonações são minhas na voz do mar.
Súbito, o sol abre um leque, pirâmide tutelas, colunas etéreas fincadas na profundidade.
Este misterioso templo riscado de gaivotas, infinito desvelo, gemas do mistério colossal, este portento é o Deus dos meus altares, domínio do meu cismar.

VITRINE

Na Rua Barata Ribeiro, o marginal, o maltrapilho,
Olha a vitrine do Centro de Estética Canina.
Dentro da loja, conversam duas moças e dois cachorros.
Elegantes e perfumados, os animais brincam, cheirando-se reciprocamente....
No luxo da vidraça, a loja expõe sabonetes, xampus, berços, banheiras e comidas.
Tudo para cachorros.

NÉVOA NO PÃO D AÇÚCAR

Flutua o Cristo sobre o convés do oceano,
Guardião dos pântanos da Terra.
Cavalga filigranas nas águas movediças,
Púrpura na transfiguração dos contornos.
Na azulada sombra em que se dissolve a horizontalidade,
O Cristo voa sobre prédios e montanhas impalpáveis.
A cidade vista das alturas, permeada de névoa, perspectiva de profundidade, mergulha no mistério.
O crescimento das ondas e a textura da distância.
Quebrantos ecoando em mim.
Perplexo ante os abismos do mar,
Ponho a alma na intimidade dos enigmas,
Nas latitudes transbordantes.
Derramo soluços nos pórticos invisíveis,
Sobre o manto da miríade.
Do andaime próprio, sobre o dólmen opulento,
Eclode o cilindro portentoso,
Colosso erguido na face do mar.

PRAIA VERMELHA

Clareira de estio envolve o circulo de pedra.
Em diáfana dispersão, alada vertente,
O mar, laguna verde azul,
Passeia nuvens, matéria celeste.
Na pequena praia, represada entre montanhas,
O campo liquido se reclina
E o mar, lago aprisionado entre ilhas,
Viaja na transparência ondulada.
O espírito vislumbra as correntes em frêmito,
As ondas que cantam,
Tangendo liras de espuma no arco das pedras.

MÁRCIO CATUNDAMárcio Catunda Ferreira Gomes é cearense de nascimento, formado em Direito e em Diplomacia, vivendo por isso constantemente no exterior. Possui uma obra que totaliza 28 títulos publicados, entre livros individuais, CDs e CD-Roms. Integrou a antologia Rios, com uma seção intitulada "Engenho Urbano", que é inteiramente dedicada à cidade do Rio de Janeiro, na qual tem familiares, amigos e onde residiu durante muito tempo.

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