quarta-feira, setembro 03, 2008
POETAS DO ESPIRITO SANTO
BENILSON PEREIRA
TESTAMENTO
Tenho a idade cravada na testa
E rugas no rosto
Mostram o conhecimento
De dias idos e vividos.
Apesar do tempo
Sou aprendiz de viver.
Embora os mais novos
Tentem mostrar-me
Como exemplo de craneologia
Pensando agradar-me
Desconhecem meu
Avessamento a símbolos.
ANDARILHO
Com o pé na estrada
Perco-me nesta vida.
Assim poço cheio
De poucas emoções
Adivinho o espaço do sonho
E descaradamente disposto
A ganhar o mundo
Ponho a cara na estrada
Muito a fim de pôr
A vida em pratos limpos.
REEDITANDO-ME
Jovem quero reeditar
Meus olhos nos seus.
Minha idéias
Se não foram boas mude-as
Hoje permito-me pensar em você
Com carinho e ternura
A morte esta fera danada
Quando vier visitar-me
Após necropsia bem sei
A causa mortis definida
Desespero e vergonha
De não ter conseguido
Melhor espaço para sonhar
Sonhos mais limpos.
Mas você vai estar vivo
Permita a este poeta
Reeditar-se em seus olhos
Para ver a construção do futuro
Que hoje teimam negar.
SEM RUMO
Meu sonho
É como carro apressado
Anda sem rumo certo
Mas sempre
Em direção a você.
ATO DE VER
Meus olhos
Mesmo de perto
Podem ver distancias
Longínquas
Que palavras negam-se
Traduzir
Prefiro mais ver a vida
Assim
Com este estranho
Olhar do coração.
LUGAR COMUM
Em Vitória
As vitórias são poucas
Ou não existem.
Aqui
O Espirito Santo
Cansado de falsos
Curandeiros culturais
Há tempos deixou
De fazer milagres.
VITÓRIA
A vitória nesta ilha
É que nestas ruas obscuras
Encontramos alguns que resistem
E mantem-se lúcidos.
O nome Vitória
Sempre ajuda resistir
Aos cretinos.
Vitório é ópio puro
Para quem sabe curtir
Sua aparente ociosidade
Esgueirando-se na obscuridade
De suas noites cheias
De um pesado e sujo mistério
Assim faço deste meu poema-cidade
Porto seguro
Onde vitorioso vejo o mundo.
BRASIL, PATRIA QUE NOS PARIU
Nada funciona na
Capital Federal
Lá políticos desnecessários
Fazem politicagem
Desnecessária
E mentem
Enquanto sem nenhuma
Vergonha
Passeiam como vermes
Sobre o copo
Agonizante da razão.
PRIMAVERA
Te vi como uma flor
Senti vontade de abrir teu botão
Aspirar teu aroma.
Mas entendo que a natureza
Não permite a nudez das flores
Antes da primavera
Ela que para nós é o encontro
De pensamentos iguais.
Aguardo a primavera
Assim você mesma abrirá
Os botões do meu jardim
Quando tirar a blusa
Viveremos sua nudez
Acariciando-nos
Com o perfume de nossos corpos.
UM ESTUDO ERÓTICO
Pelo decote ousado
Da blusa de seda fina
Paquero o bico hirto
De seu seio jovem
Ousadamente fico
Imafinando-nos
Trocando carinhos censurados
Pela caretice reinante.
MATEMÁTICA
Se quatro sentimentos
Vezes quatro
Vidas
São dezesseis paixões
Está má
Temática
Pouco me ilude.
Ando meio dividido
Em emoções fracionadas
Soma de novos encontros.
A NOITE
Pela noite adentro
Vou buscar-te
Quando despontar
O primeiro raio de sol
Quero estar adormecido
Em teu regaço.
Despertar ao oscilar das ondas
Saciar meus desejos
Na fonte inesgotável
Do teu amor.
Já então imenso mago
Ardente de beleza
Estará lançando sobre a terra
Seus últimos olhares.
Na vasta escuridão
Nos confundimos em um abraço
Pois a vida é sempre
Eterno recomeçar.
DEIXEM-ME
Sempre fui sozinho
As pessoas
Sem nenhuma vergonha
Diante de um homem só
Não entendem nada
E me dissecam
Defecando
Sorridentes e felizes
Diante da própria ignorância.
ALTERNATIVA
Sem saber
Qual meu tempo
De vida
Tento viver
O tempo
Que posso.
OCIOSAMENTE
O que fazer
Desta vida vadia
Se ela sempre
Nos pega
Vadiando por ai.
AMOR
Nos bares da vida
Me encontro
E me desencontro
De você.
EPITÁFIO
Depois de morto
Sou só morto.
Não me façam canções
Não rezem missas
Não escrevam versos
Não me encham o saco
Nem me mandem flores
Pois não poderei mais
Sentir perfumes.
Deixem em paz
Se estou no céu
Ou no inferno
Só a mim importa.
Tratem de olhar em frente
Tentem melhorar o dia seguinte
Para os que estão vivos.
BENILSON PEREIRA – O poeta capixaba Benilson Pereira sempre esteve envolvido com o movimento cultural do estado, por meio da sua literatura e teatro. Ele é autor dos livros Expressão poesias (1978), Caminhando (1980), In-versos (1981), Canção de rua (1982), O bummm do Riocentro (1981), Caricias ao vento (1984), A cumplicidade do beijo (1986) e O espaço do Sonho (1989).
FONTE:
PEREIRA, Benilsom. O espaço do sonho. Vitória: Ed. Autor, 1989.
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