quinta-feira, abril 17, 2008

POETAS DE ALAGOAS



HENRIQUE ARRUDA

CONFUSÃO NO JARDIM

Beija-flor ligeiro beijou
A colorida margarida,
Todo o néctar desta provou
De uma maneira tão atrevida,
Criando alarde no jardim
E traindo o pobre jasmim.
Desesperaram-se as acácias,
Begônias e as rosas violáceas
Por amarem o colibri.
Juraram nunca mais abrir
Tulipas, camélias e orquídeas
Por virem a cena de perfídia.
Proferiram duras calunias,
Os gerânios, cravos e lírios,
Por ciúme ou até delírios.
As papoulas e as petúnias
Apoiaram a margarida
E ainda ficaram embevecidas.
Tristeza maior para o jasmim,
Encabulado e tão calado...
Na confusão deste jardim,
Margarida foi a escolhida
Para representar assim:
Um retrato comum da vida.

CABOCLO DE LANÇA

Vai, caboclo de lança, mostra a tua raça
Dança e encanta todo esse povo pra mim.
Vai, caboclo valente... desfila a tua graça
Nos palcos da vida, praças e nos jardins.
Vai, caboclo feliz.... um louco aprendiz
Espalha a tua fantasia e desejos afins,
Lança poesia-alegria... lança magia...
Pois teus tambores e cores gritam assim.
Vai caboclo de lança, a nossa esperança;
Vai, caboclo valente, alegra essa gente;
Vai, caboclo pra sempre... meu sonho criança;
Vai, caboclo de lança que nunca se cansa.

SEM UM TEMA E SEM UM TREMA!

Da serra cerrada de cana, duma canada... daí eu caí!
Um berro, do bueiro do meio, ao meio-dia... aí eu saí.
Sou filho, não da metade, dum todo... o todo daqui,
Menino que traz no sangue a triste exangue Zumbi!
Quilombos virados... velhos engenhos... Trombetas, e aí?
Cidade... verdade... a vaidade moída que se fez decair.
Silêncio... um mudo marasmo... talho doído e profundo,
E num sonho inexeqüível, ao precipício esse mundo.

LADAINHA

O melhor tira-gosto é sardinha,
Ressaca é farinha em saca furada;
Não bebo cerveja, só cana da boa,
Mordo até casca de aratu,
Faço de vários motes minha loa,
Gosto de xote, baião e maracatu.
Apesar de não ter tino de marajo
Aprecio lagosta, siri e sururu;
Escargô é um feio caramujo
E peito de rã pra mim é cururu.
Papo de bebum eu não engulo,
De coisa pouca sei que eu me salvo,
Atravessei montes e muralhas a pulo....
Já desafiei jagunço em tiro ao alvo,
Acocorei-me na cama de faquir,
Na pedra de amolar afio a língua
E fiz bons equilibristas de fios cair,
Falta de sorte não me trará mingua;
Sou filho de deus, não tenho medo...
O homem que não sonha morre cedo!

PERFIL

Discorro em finas folhas
Quebrantadas pelo úmido tempo!
Disfarço sorrisos,
Apesar do riso trismo de um mau humor!
Defloro a ingênua razão de existir por existir:
Declarando-me o que já sou
E, no tenro retrato deste tempo,
Por um destemperado juízo: aconteço!

PERIPÉCIAS DE LAPÉRCIO

Em noite e dia... a tarde é cega;
Fatos heróicos em Igarapeba;
A verdade dói só quando pega;
História mal contada: é peba.
Seu polícia, olhe a tapia,
Eu não entre nesse jogo!
Mulher molhada é fria
Em casa pegando fogo?
Tabaco bom é muvuca
Em sinuca boa eu ensaco,
Trabalho falho não presta:
É mutuca dentro do saco.
Num trem pra tamarineira
Um doido desapareceu...
Na ponta duma pexeira
O bebum diz “não foi eu!”
E pra bandido sem coração...
Pulseira na mão ou cambão;
Cipó de fogo ou cipó de boi;
Trinta e oito ou trinta e dois.
Tabaco bom é muvuca
Em sinuca boa eu ensaco,
Trabalho falho não presta:
É mutuca dentro do saco.

HENRIQUE ARRUDA – O poeta e médico alagoano Henrique Arruda é graduado em medicina pela ECMAL – Escola de Ciências Médicas de Alagoas, tendo sido militante ativo e presente do Diretório Acadêmico II de Maio. É autor dentre outros livros, do “Do Una ao mar”, de onde foram recolhidos os poemas selecionados e foi incluído na antologia “Poetas de Alagoas”, das Edições Bagaço, 2007.

FONTE:
ARRUDA, Henrique. Do Una ao mar. Recife: Bagaço, 2002.

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