quarta-feira, abril 23, 2008

POETAS DO RIO GRANDE DO SUL



LYA LUFT

AVISO

Se me quiseres amar,
Terá de ser agora: depois estarei cansada.
Minha vida foi feita de parceria com a morte:
Pertenço um pouco a cada uma,
Pra mim sobrou quase nada.
Ponho a máscara do dia,
Um rosto cômodo e simples,
E assim garanto a minha sobrevida.
Se me quiseres amar,
Terá de sr hoje:
Amanhã estarei mudada.

VIAGEM

Não é preciso morar na esquina
Nem ser jovem ou belo:
O amor melhor é sempre dentro e perto.
Chega inesperado,
Vem forte vem doce, acalma e desatina.
Se está na minha rua ou vem de fora,
Ele ignora o tempo e a idade:
O amor é sempre agora.
É vento sutil e mar sem beira:
O amor é destino de quem está perto,
E dói sem remissão quando negado.
O melhor amor sacia a fome inteira:
Mas tem de ser aceito,
Tem de ser ousado,
Tem de ser navegado.

COMPOSIÇÃO

Quando perdi quase tudo,
Descobri que a dor não era maior que o sonho.
Quando esqueci o caminho,
Vi que o horizonte ficava do lado errado.
Quando só o mesto sobrava em cada espelho
(e nada do lado de cá)
juntei desalento e desejo e reingentei o carinho.
(agora pareço comigo antes de o amor ser cancelado).

JAZZ

A boca extrai mel do metal:
Contraponto, fingido desencontro,
Pois tudo é trama de som e desejo em espirais.
A boca extrai segredos de mel
Onde antes nada se movia.
O primeiro olhar já foi mar alto:
Estás cada vez mais perto, estás cada vez mais dentro.
O amor extrai mel do metal:
Duas almas banidas voltam do desterro,
Os destinos giram enlaçados no descompasso,
Na penumbra, na magia.

CANÇÃO EM OUTRAS PALAVRAS

O melhor cuidado com o amor é deixar que floreça,
Pois amor não se cultiva: é flor selvagem, bela por ser livre.
Como as estações do ano, ele se abre, dorme e volta a perfurmar a vida.
Amor é dom que se recebe com ternura,
Para que não pereça sua delicadeza em nossa angústia.
O amor não deve encerrar a coisa possúida,
Mas ser parapeito de janela, ou cais de onde se desprendam os revôos
E partam os navios da beleza para voltar ou não,
Conforme amarmos: nem de menos nem demais.

CANÇÃO PARA UM DESENCONTRO

Deixa-me errar alguma vez porque também sou isso:
Incrta e dura, ansiosa de não te perder, e fragil.
Deixa-me errar, e me compreende porque se te faço mal
É por querer-te, desta maneira tola, cada dia perdida
Feito criança nos teus territórios, e nessa escadaria da tua alma.
Deixa-me errar, e não me soltes, apra que eu não me enrede
Nos sustos deste amor, onde ainda espreitam o segredo,
A esperança, e um gosto inesperado de magia.

ÔNUS

A esperança me chama
E eu salto a bordo
Como se fosse a primeira viagem.
Se não conheço os mapas,
Escolho o imprevisto:
Qualquer sinal é um bom presságio.
Seja como for, eu voui,
Pois quase sempre acredito:
Ando de olhos fechados
Feito crança brincando de cega.
Mais de uma vez saio ferida
Ou quase afogada,
Mas não desisto.
A dor eventual é o preço da vida:
Passagem, seguro e pedágio.

DANÇA LENTA

Nâo somos nem bom nem maus:
Somos tristes. Plantados entre chão
E estrelas, lutamos com sangue,
Pedras e paus, sonho
E arte.
Nem vida nem morte:
Somos lúcida vertigem,
Gloira e danação. Somos gente:
Dura tarefa.
Com sorte, aqui e ali a ternura
Faz parte.

LYA LUFT – a poeta, escritora e tradutora gaucha Lya Luft é formada em letras anglo-germanicas e com mestrados em Literatura Brasileira e Linguistica Aplicada, trabalha desde muito jovem como tradutora e teve seus trabalhos bastante premiados no Brasil e no exterior.

FONTES:
LUFT, Lya. Para não dizer adeus. Rio de Janeiro: Record, 2005.
_____. Secreta mirada e outros poemas. Rio de Janeiro: Record, 2005.

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